
Situado no final dos anos 1970 e início dos 1980, o longa-metragem, que estreia nesta sexta-feira, dia 31 de julho, é intimista, conta também a história da mãe, Clarice (Debora Bloch, de "Bossa Nova"), e dos dois irmãos: Fernanda (Izadora Armelin) e Antônio (Max Huszar).
Durante 100 minutos, o espectador vai conhecer como é a rotina deles durante as férias de verão, quem são os amigos das crianças, como se divertem, além, é claro, das confusões que aprontam: afinal, são adolescentes! Namoram, brigam. E as lentes de Dhalia abusam das cenas em close, da câmera oculta (mostrando o ponto de vista da personagem). Com intimidade no assunto, Dhalia prova que há algo de biográfico na obra, uma vez que ele se inspirou em sua história pessoal para desenvolver a separação do casal, já que seus pais também se separaram.
Embora o motivo da traição de Mathias não seja claro no início, ainda assim é possível simpatizar por ele, porque a mãe das crianças é sem graça, se embriaga (chega a desmaiar), além de dizer coisas malcriadas e repletas de cinismo e sarcasmo para o marido em frente aos filhos e aos amigos.
E na luta de terminar de escrever (à máquina) o romance, Mathias se mostra alheio aos problemas pelos quais passa e aproveita esses episódios "reais" para incluí-los em sua ficção. A rejeição da mulher ele cura indo, todas as tardes, visitar Ângela (Camilla Belle, de "10.000 a.C."), uma bela americana que é fã do escritor.
O clímax do filme é quando o casal decide se separar e comunica o fato aos filhos, que não aceitam e, portanto, há um outro problema.
Dhalia, autor do roteiro ao lado da colaboradora Vera Egito, sabe delinear essas personagens, construir os diálogos e fazê-las cair nas graças da plateia. Há, porém, cenas desnecessárias que não acrescentam nada à narrativa e não são bem desenvolvidas, como quando Laura briga e faz as pazes com o namorado; quando se envolve com o barman; quando vai passear de barco com um conhecido; quando conhece Ângela; quando o pai sai debaixo de chuva à sua procura, entre outras.
As imagens captadas pelo diretor de fotografia Ricardo Della Rosa fazem jus ao espírito da fita, principalmente porque a praia exuberante é mostrada, inclusive debaixo da água transparente, costrastando com o cinza da tensão e da traição. Destaque também para a direção de arte que remete à época em que a fita se passa, e para o figurino concebido pelo estilista Alexandre Herchcovitch em seu segundo trabalho para o cinema.
Cassel contribui para a construção do seu personagem, mesmo que Dhalia não havia pensando em um francês quando escreveu o roteiro, principalmente porque fala um bom português (carregado de sotaque, é verdade), mas leva consigo o jeito de bon vivant, queimado de sol, brincalhão com as crianças.
Debora Bloch, é preciso dizer, é uma das melhores coisas do filme (se não a melhor), que faz com que sua personagem se transforme e faça com que o público note (e reconheça) essa mudança, principalmente porque, embora ela aja corretamente, existe uma repulsa por ser seca, dura, desagradável no trato com o marido e os filhos, de modo a ser egoísta e só pensar em si mesma (atipicamente para uma mãe). E a química entre os dois atores funciona, eles chegam a trocar frases em francês quando discutem (vale lembrar que Débora foi casada com um francês).
Embora a trilha sonora composta por Antonio Pinto ("Cidade de Deus") contribua para a dramaticidade do filme, ela não cessa, estando presente insistentemente durante toda a projeção.
Outro problema é que ela se repete quando o personagem aparece, tal como se fosse uma novela, enfraquecendo seu uso.
"À Deriva" é um longa-metragem da nova safra nacional, que não aposta em rostos conhecidos como apelo para a bilheteria, mas sim na força do ator, na sua interpretação em contar uma história com uma boa direção. A fita tem os seus méritos, por retratar com precisão passagens comuns da adolescência e das famílias. Usando a metáfora das pessoas boiando no mar, à deriva, Dhalia conta uma história envolvente, mas ainda falta um elemento essencial: a emoção.
Nenhum comentário:
Postar um comentário